É uma das grandes novidades em torno da quinta edição do PRIO Softboard Heroes, que acontece já esta sexta-feira nas ondas da Praia da Física (Santa Cruz).
Pela primeira vez na história do maior evento solidário de surf do país, haverá a inclusão do surf adaptado. A demonstração, que será colocada na água antes das finais por categoria, pretende celebrar o mar como espaço de igualdade.
Um dos protagonistas desse aguardado momento será Hugo Rocha, que já alcançou sucesso além-fronteiras, com a vitória em 2024 na etapa de Pantín da Para Surf League e a medalha de bronze no Europeu de 2023.
Em entrevista concedida ao MEO Beachcam, Hugo fala sobre a sua ligação à modalidade e a importância da mesma na sua vida.
Como é que surgiu a ligação ao surf?
Surgiu através do Hugo Maia, que era o capitão da minha equipa de basquetebol em cadeira de rodas. Ele já surfava, mesmo com limitações físicas. Foi isso que me inspirou. Ver alguém desafiar o mar daquela forma foi uma inspiração e fez-me pensar: "Por que não eu?"
O entusiasmo cresceu rápido. Comecei a procurar pranchas, mas na altura não tinha possibilidades financeiras para comprar uma. Os meus filhos, percebendo o quanto falava de surf, ofereceram-me a minha primeira prancha. Em outubro de 2019, entrei no mar pela primeira vez, ainda sem prótese para água salgada. Por isso, comecei a surfar de joelhos. A partir daí, nunca mais parei. O mar tornou-se o meu espaço de liberdade e superação.
Que efeito teve a prática da modalidade na sua vida?
Teve um impacto profundo. O surf deu-me uma nova perspetiva de vida. Depois do acidente, houve um longo processo de reconstrução, não só física, mas também emocional. Trouxe-me autoconfiança, foco e equilíbrio. Mais do que um desporto, tornou-se uma terapia para mim.
Dentro de água, deixo para trás todas as limitações e reencontro-me com aquilo que sou. Além disso, ajudou-me a estabelecer rotinas e a manter uma disciplina de treino.
Quais as melhores recordações que tem em cima de uma prancha de surf?
Há muitas, felizmente. Mas algumas das mais marcantes aconteceram logo nos primeiros tempos, quando tudo ainda era novidade. Lembro-me com muito carinho do gesto do Christian de Barros, que me ofereceu a prótese para poder surfar. Foi graças a isso que tive a oportunidade de experimentar o surf em pé. A partir daí, vivi momentos inesquecíveis, mas há um que me lembro em especial: a primeira onda com a prótese. Não foi só uma vitória técnica, mas do ponto de vista emocional também.
O que significa o mar para si?
Para mim, o mar representa liberdade. Quando estou dentro de água, tudo aquilo que em terra parece um obstáculo, desaparece. Mas também o vejo como um desafio. Obriga-me a estar atento, a ser humilde e paciente. É um espaço de cura, de conexão com a natureza e também de respeito.
Penso que é assim para muita gente. Por isso, devemos sentir a responsabilidade de o preservar. Cada vez mais acho que devíamos todos ser “embaixadores” do mar e amplificar esta mensagem com todos os que nos rodeiam. Iniciativas como o PRIO Softboard Heroes são fundamentais, não só por criarem um ambiente sustentável, com o uso de pranchas softboard – conhecidas pelos seus materiais não convencionadas – bem como materiais reutilizados ano após ano para as estruturas do evento, mas também por mostrarem que o compromisso com o planeta pode ser tão inspirador quanto bonito.
Qual a importância da inclusão do surf adaptado neste tipo de eventos solidários?
Estes eventos dão-nos visibilidade e mostram que o surf não tem de ter um molde único. Só o facto de estarmos presentes, desafiamos preconceitos e abrimos caminho para outras histórias como a nossa. Mostramos que a deficiência não precisa de ser uma limitação; é, muitas vezes, a origem de novas formas de superação
A participação em eventos solidários, como o PRIO Softboard Heroes, permite-nos inspirar e ajudar outras pessoas, com ou sem incapacidades motoras, a sair da sua zona de conforto, a acreditar que é possível fazer parte de algo maior. E para quem está dentro da comunidade do surf adaptado, como é o caso da
SURFaddict, estes momentos são oportunidades de reconhecimento e validação do esforço diário que fazemos.
Como é que tem visto a evolução do surf adaptado ao longo dos anos?
A evolução tem sido crescente e muito positiva, especialmente nos últimos cinco, seis anos. Há mais atletas, mais iniciativas, maior visibilidade e também um trabalho mais sério e estruturado por parte das organizações. Lembro-me que, quando comecei, as condições eram mais limitadas. Hoje, já existem campeonatos com categorias bem definidas, técnicos especializados e uma crescente aposta na formação e no apoio aos atletas.
Contudo, ainda há muito caminho a fazer, principalmente a nível nacional. Precisamos de mais apoios, maior investimento em equipamentos adaptados e, sobretudo, de políticas que tornem o acesso a este desporto verdadeiramente universal. A mudança está a acontecer, mas tem de ser contínua e acompanhada de um compromisso real de todos com a inclusão.
Através da rede de livecams, podes visualizar em direto e em tempo real toda a evolução do estado do mar e da praia.
Podes também confirmar as previsões relativas a todas as praias através da nossa página Praias Beachcam.
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